A dúvida mais comum entre os médicos que trabalham expostos a agentes nocivos à saúde, é se poderão continuar trabalhando após ter sido concedida a aposentadoria especial.
Mas afinal, o que diz a legislação sobre a possiblidade do médico continuar trabalhando?
Médicos aposentados devem ser afastados de ambientes insalubres?
Este assunto foi tratado pelo STF em 2020, e o entendimento em repercussão geral (isto é, com validade para todos) define que:
“I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.”
E mais:
“II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.”
Mas afinal, médico aposentado pode continuar trabalhando?
A resposta mais apropriada pode parecer paradoxal: sim e não. Isto significa que a Aposentadoria Especial do Médico permite continuar trabalhando, mas sem exposição aos agentes nocivos. Ou seja, o trabalhador que venha a obter a aposentadoria especial, pode continuar trabalhando, desde que seja em outra função.
O STF entendeu, inclusive, ser constitucional o cancelamento da aposentadoria, se o segurado continuar trabalhando em função que prejudique sua saúde. Não sendo relevante se a atual atividade é a mesma que lhe garantiu o benefício, e sim se continua exposto ao risco.
Portanto, é constitucionalmente possível o cancelamento da aposentadoria especial se o segurado continuar trabalhando em atividade insalubre ou a ela retorne, seja essa atividade especial aquela que justificou ou não a aposentadoria precoce.
IMPORTANTE: O STF não proibiu a exposição eventual, parcial ou temporária, a ambientes nocivos à saúde, apenas a exposição que enseje o direito à aposentadoria especial, ou seja, a exposição habitual e permanente.
Assim, o médico aposentado pode ainda trabalhar, porém a nova atividade não pode lhe causar exposição habitual e permanente a agente agressivo à saúde.
A decisão do STF assegura ainda, aos segurados que trabalham com insalubridade, o direito a receber os atrasados em caso de reconhecimento da aposentadoria especial na justiça.
Assim, mesmo que o segurado continue ou retorne ao trabalho nocivo, ele terá direito ao pagamento dos valores retroativos à DER (Data de Entrada do Requerimento). Isto porque a decisão do STF só exige o afastamento da atividade especial após a implantação do benefício.
Consequentemente, se ficar comprovado que o segurado continua a exercer atividade insalubre após a efetivação do benefício, este será cancelado de forma automática.
O argumento é de que o benefício é pago para que o aposentado não possua mais contato com nada nocivo à saúde, então manter a atividade invalidaria o propósito da aposentadoria especial.
Isto porque o benefício possui justamente a função de preservar o bem-estar, a integridade e a saúde do segurado, sendo concedido para permitir que o indivíduo não tenha mais qualquer contato com trabalhos que possam apresentar risco à sua saúde.
Contudo, a decisão ainda não afeta os servidores públicos, os quais devem sair do cargo apenas se utilizarem o tempo daquele cargo ou se obtiverem uma aposentadoria especial no INSS. Mas se obtiver aposentadoria especial no RPPS, então pode continuar na profissão após sair do cargo.
O médico que conseguiu na Justiça continuar em atividade especial deve devolver os valores?
Alguns aposentados especiais entraram na Justiça para terem o direito de receberem a aposentadoria especial e, também, continuarem trabalhando em atividades nocivas ou periculosas.
No que tange à modulação dos efeitos da tese de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal decidiu diferenciar duas situações:
- Processos com decisão favorável ao segurado obtida por meio de tutela provisória: em razão da repercussão geral da tese, a decisão será revogada e, consequentemente, possuirá vigência somente até a data de sua revogação (de modo que o segurado poderá continuar trabalhando em atividade especial e recebendo aposentadoria especial até a referida data).
E, com relação aos valores anteriormente recebidos (até a publicação do julgamento dos embargos) pelo segurado, estes NÃO deverão ser restituídos ao INSS (o STF reiterou seu entendimento sobre irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão administrativa ou judicial).
- Processos com decisão favorável ao segurado e que transitaram em julgado até 23/02/2021 (data do julgamento dos embargos no Tema n. 709/STF): em respeito ao direito adquirido, NÃO haverá modificação da decisão, de modo que o segurado poderá continuar trabalhando em atividade especial e recebendo aposentadoria especial.
Ou seja, são casos específicos de aposentadoria especial de trabalhadores que receberam o benefício e continuaram trabalhando.
E o médico que converteu parte do período especial em comum?
Caso a aposentadoria seja comum, mesmo que tenha convertido parte de período especial em comum, com a finalidade de se aposentar antes ou aumentar o valor do benefício, o aposentado poderá continuar trabalhando regularmente em sua atividade. Neste caso, a aposentadoria não impedirá que continue em seu trabalho, ou retorne a ele.
Isto porque não se trata de aposentadoria especial. A aposentadoria continua sendo comum, apenas houve conversão de período.
Mas o que é aposentadoria especial?
A aposentadoria especial é um benefício previdenciário concedido ao trabalhador que exerce suas atividades com exposição a agentes nocivos, que podem causar prejuízos à saúde e integridade física com o passar do tempo.
Têm direito à aposentadoria especial, o trabalhador que comprovar, além do tempo de trabalho, a efetiva exposição a agentes químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais definidos pela legislação em vigor à época do trabalho realizado por período exigido para a concessão do benefício (15, 20 ou 25 anos a depender do grau de risco).
O que fazer se o médico aposentado quiser continuar trabalhando?
Existem duas alternativas viáveis ao beneficiário da aposentadoria especial que deseja continuar trabalhando:
- Requerer a conversão do tempo especial em comum;
- ou exercer atividade não insalubre (comum).
Na primeira hipótese, o segurado, ao se aposentar, pode requerer a aposentadoria comum (e não a especial), realizando a conversão do tempo especial em comum. Em geral, este benefício apresentará valor inferior à aposentadoria especial, porém, ao menos permite que o segurado consiga exercer qualquer atividade laboral (insalubre ou não).
Já no segundo caso, se o aposentado especial optar por continuar trabalhando em uma atividade comum (não insalubre), ele poderá perceber as duas rendas concomitantemente, ou seja, não há impedimento para que ele continue recebendo a aposentadoria especial.
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